A ECONOMIA É UMA CIÊNCIA SOCIAL

A ECONOMIA É UMA CIÊNCIA SOCIAL

*Antônio Augusto Ribeiro Brandão

“O paradoxo brasileiro está exatamente na altíssima propensão a consumir dos ricos. A concentração de renda no Brasil não é para aumentar a taxa de poupança, é para aumentar o consumo dos de alta renda.” Celso Furtado (1920-2004).
Se os fundamentos da Economia estão corretos, por que os resultados não correspondem? Qual é o problema: estamos usando e/ou combinando mal a teoria existente ou precisamos de novas formulações? A propósito, lembro André Lara Resende e sua ‘nova macroeconomia’.

Quando se estuda a Teoria do Consumidor, o cerne da microeconomia, parte-se do pressuposto do comportamento racional, da psicologia em relação à oferta e demanda, para que se possa compreender certas conjunturas. Há também a questão do “ceteris paribus”, uma abstração que condiciona certas previsões. Economistas então premiados com o Nobel, defenderam a tese da influência da psicologia nas relações de mercado.

O Brasil ao longo do tempo tem experimentado as agruras de uma política cambial contraditória: quando do advento do Real, houve a ‘farra’ das importações àquela altura mais baratas para o nosso país. Fazia sentido, pois precisávamos atualizar tecnologicamente o nosso parque industrial, preparando-nos para uma eventual abertura comercial, e fortalecer o mercado interno; as exportações e o consumo doméstico passariam a crescer movidos pela modernização das indústrias e pela geração de emprego e renda.

Atualmente, a situação inverteu-se e beneficia as exportações, mas sem preço e termos de competição, e ainda perdemos a oportunidade de modernizar o nosso parque industrial.

A primeira desvalorização do Real visou restabelecer o equilíbrio comercial, facilitar as exportações e dificultar as importações. Foi a abertura feita ‘antes tarde do que nunca’; então invertemos a mão, mas as empresas não responderam suficientemente ao poder dos concorrentes de outros países. Se a balança comercial não gera dólares, recorre-se aos investimentos diretos e/ou aos empréstimos via aumento da dívida pública.

Os investimentos, agora, feitos por organizações transnacionais que se instalaram após o processo de privatização principalmente, exigem a contrapartida das importações, que pressionam o dólar. O processo de endividamento torna-se, assim, inexorável. E a conjuntura internacional recessiva, com alguns países desenvolvidos desacelerando sua economia, concorrem para agravar o drama vivido pelo Brasil.

Certo estava John Maynard Keynes, criador da macroeconomia, que sempre advogou a presença do Estado na economia, como mecanismo capaz de injetar recursos quando a iniciativa privada não conseguisse fazê-lo. Hoje, no Brasil, essa presença do Estado resume-se ao exercício de um poder regulador nem sempre eficiente.

Estão querendo privatizar tudo, desnacionalizar nosso patrimônio, mas continuamos devendo muito. Fizeram ainda contratos garantindo reajustes automáticos para os chamados ‘preços administrados’, por exemplo, que encarecem o custo de vida, mas não são computados nos índices oficiais de inflação. E, agora, com a crise cambial, os preços livres estão sendo contaminados numa generalização que torna evidente o recrudescimento de um processo inflacionário.

Estão praticamente esgotados os tradicionais instrumentos de política monetária, para conter a alta do dólar; além disso, já ‘queimamos’ boa parte das nossas reservas. A dívida pública ultrapassou os trilhões de reais, mais interna do que externa, a custos cada vez maiores e prazos de resgate cada vez menores. Como vamos sair desta? A saída? Onde está a saída?

Vamos torcer para que prevaleça a teoria microeconômica e que os agentes que fazem a economia, vencidas as etapas da crise, revertam as expectativas de quem tem comportamento racional e age psicologicamente diante dos mercados.

*Economista. Membro Honorário da ACL, ALL e AMCJSP.

CHÁ E SIMPATIA

 

CHÁ E SIMPATIA

 *Antônio Augusto Ribeiro Brandão

 “A leitura faz do homem um ser completo, a conversa faz dele um ser preparado e a escrita o torna preciso.” Francis Bacon (1561-1626), filósofo, escritor e ensaísta inglês.

 

Outro dia e depois de muito tempo restabeleci contato com um amigo de longas datas. Ao saber que eu, agora, sou membro de Academias de Letras, ele foi logo dizendo: “A Academia Brasileira de Letras – ABL o espera para o ‘chá dos imortais.’ Quer dizer: está na gênese do processo e na cabeça das pessoas o desejo normal de progredir na escala acadêmica e poder desfrutar das amenidades que o galardão encerra.

 Nada mais justo a confraternização permanente entre os confrades e confreiras, uma prova de ‘liberdade, igualdade e fraternidade’. Deveria ser assim, mas nem sempre é. Como membro da Academia Caxiense de Letras – ACL, Academia Ludovicense de Letras – ALL e Academia Maranhense de Cultura Jurídica, Social e Política – AMCJSP, frequento também a Academia Maranhense de Letras – AML e, sempre, sou bem recebido pelos amigos de antes e pelos feitos depois, mas “santo de casa não faz milagres.”  

 Sou um defensor das tradições e dos rituais acadêmicos. O Estatuto da ABL, que foi modelo para outras academias, diz: “A Academia tem por fim “[…] a cultura da língua nacional, sendo composta por quarenta membros efetivos e perpétuos, conhecidos como ‘imortais’, escolhidos entre os cidadãos brasileiros que tenham publicado obras de reconhecido mérito ou livros de valor literário […]”.

 O cargo de ‘imortal’ é vitalício; a sucessão dá-se apenas por morte do ocupante da Cadeira, sempre elogiado, exceção para os que migram de categoria tornando-se membros Honorários, conforme na ACL, ALL e AMCJSP.

 A Academia Brasileira foi inspirada na Academia Francesa, fundada por Armand Jean du Plessis (1585-1642), o Cardeal de Richelieu, que, em 1635, sob o reinado de Luís XIII de França; fechada durante a Revolução, em 1793, foi restabelecida por Napoleão Bonaparte, em 1803.

 Para demonstrar que ‘a Academia não faz política, mas é política’, em Paris daquela época (décadas de 1620 e 1630), vários grupos se reuniam para debates literários; o Cardeal Richelieu acabou por adotar um desses grupos e fazê-lo embrião da Académie Française.

 O começo das Academias, que se disseminaram pelo mundo todo, sempre, foi assim. Mais tarde os procedimentos foram ficando democráticos e transparentes. Hoje, quem se achar enquadrado nas exigências acadêmicas pode ser candidato: tem que proclamar essa intenção e concorrer em igualdade de condições com os outros pretendentes.

 Modernamente tudo ainda é muito solene e burocrático. Não esqueço o ritual de posse. O eleito adentra o salão nobre da Academia acompanhado por membros mais antigos, assina o Termo, veste o fardão e recebe o ‘colar’ com a medalha; em seguida é saudado por um dos Confrades e pronuncia o discurso normalmente evocando seu Patrono e/ou quem sucede. Uma grande emoção toma conta de todos.

 Mas há outros momentos dignos de recordar no decurso da vida acadêmica uns igualmente solenes e outros, nem tanto. Um desses momentos solenes foi a fundação da Federação das Academias de Letras do Maranhão – FALMA, por inspiração maior do confrade Sálvio Dino e apoio incondicional da AML.

 A Federação foi conduzida por diretoria pioneira encabeçada pelo incansável presidente Álvaro Urubatan Melo, da Academia Sambentuense de Letras; depois de intenso processo burocrático para tornar-se pessoa jurídica, a FALMA foi reconhecida como de utilidade pública e empenhou-se na filiação das Academias disseminadas pelo Estado, o que vem conseguindo.

 Há, entretanto, momentos muito sérios que, no meu entendimento, as Academias – mesmo ainda não filiadas à Federação – deveriam participar no equacionamento de possíveis problemas e encaminhamento de soluções, pois dizem respeito à comunidade na qual estão inseridas. É quando cada uma delas ‘não faz política, mas é política’. Reunindo em seus quadros pessoas representativas da sociedade, naturais guardiãs da cultura, dos valores e crenças dessa sociedade, seria um desperdício uma visão restrita de uma competência essencialmente institucional.

 É o caso, por exemplo, do que vem acontecendo com o patrimônio histórico de Caxias, em paulatina e acelerada destruição.  A ‘Casa de Coelho Neto’ vai precisar ser fortificada e apoiada pelas demais congêneres na tomada de uma posição a respeito desse grave problema.

 

Economista. Membro Honorário da ACL, ALL, e AMCJSP.

 

Crônica: Envelhecer

ENVELHECER

Por: Antônio Augusto Ribeiro Brandão¹

Artigo da economista e escritora Eliana Cardoso, há tempos, inspirou este texto.

Fiquei sabendo, por exemplo, que o conceito de velhice depende do sentido conferido à vida; que já superei os anos estimados a viver, hoje, em torno de 82 em países da Europa; que o passar do tempo modifica a relação do indivíduo com a sociedade na qual está inserido.

Quando eu nasci, primogênito entre dez irmãos, a expectativa de vida era bem menor dadas principalmente as condições de saúde, pois a medicina ainda não havia sequer descoberto a penicilina; as famílias, como a minha, cuidavam de suas crianças na base de remédios caseiros e fortificantes existentes nas farmácias e drogarias, inclusive com séries anuais de injeções de cálcio e vitaminas.

Foi assim que eu, desafiando a lógica, fui vencendo as crises de asma acometidas desde a infância, passando pela adolescência e, por incrível que possa parecer, menos agora, na velhice; lembro dos tratamentos evoluindo ao longo do tempo e da superação dos riscos enfrentados em certas oportunidades, das injeções de Adrenalina, pois podia ter morrido com o coração acelerado e quase ‘saindo pela boca’!

Eliana Cardoso cita alguns autores famosos no trato da questão do envelhecimento e de como as lembranças do passado podem definir comportamentos: casais idosos solitários que imaginam um tempo que não volta mais (Eugène Ionesco, 1909-1994), mas a minha solidão é de viúvo; evocando amores passados (Samuel Beckett, 1906-1989); uma visão mais otimista de Cícero (106 43 a.C), dirigida aos senadores de Roma, que a idade, diferente de desequilibrar, aumenta suas capacidades.

Ela cita também o filósofo Ralph Waldo Emerson (1803-1882), que o crítico Harold Bloom incluiu em seu livro “O Cânone americano”, gabando os méritos e a serenidade da última idade; ele diz que “o velho é feliz primeiro porque escapou de perigos múltiplos e já não tem o que temer, e com a vida atrás de si, ela lhe pertence e ninguém pode roubá-la”.

Penso que é isso mesmo: plantei várias árvores, escrevi cinco Livros, casei com a Conceição, sou pai de quatro filhos e avô de cinco netos; trabalhei, estudei e passei boa parte da vida ensinando o que aprendi, nas Universidades Estadual e Federal do Maranhão. Foi fácil? Não, contudo continua valendo a pena.

Sabe-se sobre o escritor que mais exaltou a velhice, Victor Hugo (1802-1885), relembrado pelo incêndio da Notre-Dame de Paris, que menionava “o contraste romântico entre um corpo enfraquecido e um coração indomável”; Michel de Montaigne (1533-1592), “recusa tanto a zombaria da velhice quanto sua exaltação, que para aqueles que empregam bem o tempo, a experiência e a ciência crescem com a vida, mas a vivacidade, a prontidão, a firmeza e outras características essenciais se enfraquecem ou desaparecem”.

Corpo enfraquecido, é verdade, bem como ‘outras características essenciais’, todavia a experiência cresce à medida em que se envelhece. Há exemplos brasileiros exaltados por Clarice Lispector (1920-1977); Simone de Beauvoir (1908-1986) diz que “mais vale viver uma velhice ativa, mas que essa possibilidade, contudo, pertence aos privilegiados”.

Agora, um pouco sobre a motivação maior do artigo de Eliana Cardoso, ‘a vida no longo prazo’ face à nunca acabada Reforma da Previdência. Ela diz: a fonte mais importante de rendimentos dos idosos são as aposentadorias e pensões; que a renda média dos idosos economicamente ativos é mais do dobro da renda média da população entre 14 e 64 anos; entretanto, apenas uma parcela pequena da população acima de 65 anos se mantém ativa.

E mais: “Os idosos ativos com mais de 65 anos representam apenas 15% dessa faixa da população, e entre as pessoas acima de 75 anos, somente 5,5%; (…) apenas uma minoria privilegiada consegue se manter ativa e independente na velhice”.

Trabalhei, oficialmente, até 2020, desde 1955: no Rio de Janeiro, onde fiquei por dez anos e formei-me em Economia; em São Luís, desde 1965, quando participei da Reforma Administrativa do Estado enfatizando a criação das primeiras escolas de nível superior, no caso a Escola de Administração Pública, da qual fui professor fundador e titular; e, por pouco tempo, em 1987, em Brasília, no Ministério da Ciência e Tecnologia.

Por todas essas verdades, dou graças a Deus!

¹Economista. Membro Honorário da ACL, ALL e AMCJSP.

A Guerra da Ucrânia e Rússia: fundamentos, Brasil e Maranhão

A Guerra da Ucrânia e Rússia: fundamentos, Brasil e Maranhão

Por:

Michel Teixeira, cursou Economia na Universidade Mackenzie – SP e pós-graduação em Engenharia Financeira na USP.
João Marques,  Economista e o mestre em Desenvolvimento Socioeconômico pela UFMA.

1. Fundamentos básicos para a compreensão da Guerra da Ucrânia

  A compreensão dos fatos deve ser elucidada através de uma análise que relaciona aspectos pretéritos com os do porvir. Em outras palavras: conhecer a história é saber a origem que nos leva a entender o hoje e a prever o amanhã. Assim – para o melhor entendimento do verdadeiro sentido da atual invasão da Ucrânia pela Rússia – será feita uma breve análise histórica.
O fim da Guerra Fria não representou apenas a vitória do modo de produção capitalista sobre o comunismo, mas uma mudança na Nova Ordem Mundial, onde o poder global europeu – predominante desde a Revolução Industrial – dá lugar ao imperialismo norte-americano. Nesse sentido, a consolidação capitalista do pós-Guerra Fria definiu claramente o tom hegemônico contemporâneo.

  A queda do muro de Berlim e a dissolução da União Soviética, por sua vez, deram início a uma nova tendência mundial marcada pela interdependência entre os países e pela concentração do poder em macro áreas. A partir de então, os Blocos Econômicos, como a União Europeia (UE), passaram a fazer parte das batalhas comerciais mundiais, atribuindo uma tendência de caráter multipolar à Ordem Mundial.

  A expansão da União Europeia é uma ação racional de cooperação, que favorece a criação de mercados cada vez maiores e oferece alternativas de desenvolvimento, além de estimular investimentos e dinamizar o comércio interior e exterior. A partir desta lógica, tem-se que o crescimento do bloco europeu deve ser encarado como estratégia à guerra comercial capitalista do século XX.

  A adesão das antigas nações socialistas ao bloco, contudo, é algo muito mais complexo e sensível. Não à toa, um dos maiores desafios da União Europeia sempre foi trazer para dentro do bloco um conjunto de Estados remanescentes da ruína do império soviético, muitos dos quais, atualmente, mais simpáticos aos Estados Unidos e aos principais países europeus do que à Rússia.

  Todavia, nem a queda do Muro de Berlim, nem a dissolução da União Soviética marcaram o fim das divergências entre a Rússia e o Ocidente, pelo contrário, os atuais bombardeios russos à Ucrânia são uma clara demonstração de força da Rússia aos países membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte – OTAN.

  Diga-se de passagem, aos que pretendem compreender com mais afinco, que a OTAN não é um mero instrumento de paz criado “pós-guerra”. A aliança formada em 1949 com 12 países integrantes também teve um forte impacto no direcionamento da Guerra Fria, exercendo pressão avassaladora na extinta URSS e sobre a Ordem Mundial. Não obstante, nas inúmeras intervenções militares no pós-guerra fria – Kuwait, Turquia, Bósnia, Herzegovina, Kosovo, Afeganistão, Iraque e Líbia -, a OTAN também atuou como uma instituição incorporadora de novos países, expandindo-se pela Europa, somando, atualmente, 28 países integrantes e sondando inclusão de novos membros, como a Geórgia e a própria Ucrânia.

  A Rússia nunca foi a favor da independência dos países que integravam a União Soviética; uma prova disso foi a guerra com a Geórgia, em 2008, que também envolveu questões econômicas como o petróleo e o gás natural, nomeadamente um oleoduto que se estende do Azerbaijão, atravessando a Geórgia e a Turquia, e abastece a Europa Ocidental, em cujo período foi citada a possibilidade de sua participação “futura” na OTAN. Ora, com a Ucrânia, não é diferente.

  Em 1990, a Ucrânia assinou um pacto pela sua independência, abandonando suas armas nucleares e reduzindo o seu poderio bélico acordado pelo Memorando de Budapeste, assinado pela Ucrânia, Rússia, Reino Unido e os Estados Unidos. Em 1994 aderiu ao “Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares”, o que a obrigou a devolver as ogivas nucleares a Moscou, e, em 1996, o memorando foi reforçado pela assinatura de Belarus e do Cazaquistão.

  Em 2014, na Ucrânia, aconteceu a Revolução da Dignidade ou Revolução Ucraniana, movimento que foi acompanhado de manifestações violentas contra o presidente eleito, Viktor Yanukovych, que oscilava no poder desde 2004. Desde então, o país passava por uma forte crise econômica derivada de problemas monetários, fiscais e da forte corrupção, e um dos mecanismos possíveis de auxílio seria a adesão à União Europeia, que fora retirada de pauta por Yanukovych, que optou por um tratado com a Rússia. Essa medida, em um país de independência ainda recente, foi um dos estopins para acalorar as manifestações internas e fortalecer a oposição.

  Durante todo esse período, a Ucrânia passou por golpes de Estado contra Yanukovych e ações judiciais que o retiraram do poder. A Rússia se recusou a reconhecer o novo governo ucraniano, mais próximo do Ocidente e com apoio do Fundo Monetário Internacional (FMI). Neste momento, a Rússia iniciou um movimento de retaliação à Ucrânia, visando retomar a região da Crimeia, que havia sido anexada pela Ucrânia, acirrando o conflito entre os dois países.

  Além de ser uma potência nuclear, a Rússia detém um arsenal militar invejável. Não obstante, suas armas mais poderosas, sob o ponto de vista estratégico, são o petróleo e o gás natural. Vale lembrar que a Rússia é a maior fornecedora de gás natural para a Europa e o terceiro maior produtor de petróleo do mundo.

  Vladimir Putin lançou seu ataque à Ucrânia por conta de seu ressentimento sobre o colapso do antigo império soviético, mas não teria feito isso se não ocupasse um protagonismo comercial e militar em termos globais. Afinal, ele sabe que muitos países europeus dependem de suas fontes energéticas, dentre eles, a poderosa Alemanha. Ademais, se não tivesse construído, nos últimos dez anos, ótimas relações comerciais com a China.

  Apesar disso, a guerra da Ucrânia não se resume a meros ressentimentos, rancores e limites de territórios, mas desenrola-se sobre a influência americana na Europa e o equilíbrio internacional de poder. O que Vladimir Putin almeja, de fato, vai muito além de uma invasão da Ucrânia. Ele está propondo aumentar o poder e a riqueza do seu país. A existência de eixos de conflitos crônicos, junto com a permanente possibilidade de uma nova guerra entre os grandes potenciais foi o caminho escolhido por ele para ordenar e estabilizar as novas relações hierárquicas que pretende construir.

  Simultaneamente, Putin põe a teste a capacidade intervencionista da OTAN para proteger seus aliados não membros integrantes, uma vez que a Ucrânia manifestou interesse de aderir a Ordem, mas não está inclusa como integrante oficial e, portanto, não contemplado pelo famoso artigo 5º do Tratado que requer que os Estados-Membros auxiliem no caso de ataques armados.

  Além da brecha institucional, a Rússia possui um forte poderio bélico e nuclear que serve como uma barreira para intervenção dos demais estados no conflito, uma vez que eventual frustração da Rússia na invasão da Ucrânia poderia acionar a adoção de medidas mais drásticas por Vladmir Putin e cujo impactos seriam ainda mais desastrosos para o planeta.

  O receio de uma participação da China, em constante guerra comercial com os EUA e em busca da hegemonia econômica mundial, também é um forte vetor que ameaça e nivela as forças de combate com a OTAN, no caso de uma eventual aliança com a Rússia. A incerteza nesse cenário é mais perigosa do que sua confirmação.

  Ainda é muito cedo para se fazer qualquer tipo de previsão acerca do desfecho da invasão da Ucrânia, bem como suas consequências, em termos geopolíticos. Todavia, a possibilidade de Rússia e China, juntas, reestabelecerem uma Nova Ordem Mundial, não pode ser desprezada, uma vez que a atual crise econômica global pode expor inúmeras fraquezas do Ocidente.

2. Restrições, boicotes, embargos e os impactos econômicos diretos

  Com a impossibilidade de fazer um ataque militar direto através da OTAN, a estratégia mais evidente do ocidente vem sendo através da economia, realizando inúmeros embargos, boicotes e ações restritivas para a Rússia. Nesse escopo, destaca-se não exportação e importação de produtos russos, encerramento de atividades de empresas multinacionais no país, bloqueio a Sociedade de Telecomunicações Financeiras – SWIFT, sanções contra indivíduos (congelamento de ativos, revogação de vistos), bloqueio das reservas russas internacionais, proibição de operação de bancos russos no exterior, restrições de viagens, encerramento de serviços virtuais e de contas em plataformas de multimídia, bloqueio de empresas áreas russas, de navios russos, suspensão de investimentos das multinacionais na Rússia, boicote nos setores de energia (destacando petróleo e gás natural), tecnologia e redes, montadoras, cartões de crédito, varejo, franquias gerais, e, por fim no setor de cultura e lazer.

  Como isso afeta a Rússia? Embora o país tenha se preparado para invadir a Ucrânia, possua recursos suficientes e autossuficiência para se manter por um longo período sem o setor externo, as medidas afetam drasticamente a economia através de vários mecanismos. Primeiramente o câmbio e a inflação, reduzindo a capacidade de adquirir produtos no exterior – mesmo de países que não adotaram as restrições econômicas; a inflação, através do aumento dos custos internos e redução da oferta de mercadorias.

  Outro efeito é através da ampliação do desemprego no país via saída de inúmeras empresas e do cancelamento de investimentos e outras atividades, reduzindo a renda da população – o que pode ampliar as pressões internas, manifestações e demandas sociais. Também há de ressaltar, o impacto no efeito do sistema financeiro, que além de atrapalhar negociações internacionais, atrapalha a dinâmica do mercado interno, e a circulação de recursos, fragilizando ainda mais o mercado interno russo. Ademais, além dos impactos deve ser ponderado toda a relação provocada pela própria situação de guerra, os investimentos privados reduzidos, elevado nível de incerteza, a busca por liquidez e a fuga de capitais.

  Os impactos dessas restrições não afetam somente a Rússia. Embora os russos sejam penalizados de inúmeras formas, a economia global também será drasticamente afetada. A Rússia como um grande player do mercado de fertilizantes, petróleo, gás natural e trigo ao sair do jogo e ser colocada de escanteio pelo mercado exerce uma grande redução da oferta desses produtos ao redor do globo.

  O preço do gás natural, do petróleo, do trigo e dos fertilizante já estão em alta ilustrando esse impacto. Como consequência inúmeros produtos dependentes dessas commodities se tornarão bem mais caros, são exemplos o gás de cozinha, energia elétrica, combustíveis e lubrificantes, a farinha, o pão e seus derivados, produtos da agropecuária como soja, milho, sorgo, arroz e proteína animal, e, consequentemente exercendo forte pressão inflacionária em nível global.

  Desta forma as medidas de embargo, boicotes e restrições também atuam como uma faca de dois gumes, ao passo que prejudica drasticamente a economia russa, também exerce pressões ao redor do globo, onde os países mais pobres provavelmente serão os mais impactados, tendo em vista o nível de renda da população e os ainda presentes danos provocados pela COVID-19.

3. O Ricochete no Brasil e Maranhão 

  Diante dessa perspectiva é óbvio que haverá um forte impacto na economia brasileira e no Maranhão. O país além de ser um grande exportador das commodities agrícolas que serão beneficiadas em “preço”, também é um forte importador de muitas dessas mercadorias.

  O preço do petróleo afetando a economia brasileira não é mais nenhuma novidade, uma vez que desde a pandemia estamos vendo a alta do câmbio e o preço do barril deteriorar o poder de compra do brasileiro elevando o nível de preços através do crescimento dos custos de operação – do sistema logístico dependente das rodovias e dos insumos mais caros. Nesse escopo, a batalha na Ucrânia provocará uma maior pressão no sistema de preços, uma vez que a Petrobrás já anunciou os novos reajustes (18,77% para a Gasolina e 24,9% para o diesel) e que entraram em vigor no dia 11 de março.

  Apesar da elevação dos preços via cambio e combustível, no período pandêmico não se viu o preço dos fertilizantes exercendo pressões demasiadamente negativas – embora tenham crescido. Nesse diapasão, deve-se reiterar que a 30% do fertilizante importado pelo Brasil vêm da Rússia e Belarus, ou melhor, vinha, uma vez que já foram canceladas as aquisições. Diante disso, o país está com tratativas com outros produtores para tentar atender a demanda nacional, contudo, os outros grandes players possuem um preço mais elevado, e a escassez no mercado os deverá elevar ainda mais. Com a alta dos fertilizantes o custo dos alimentos sobe, uma vez que a produção dos grãos encarece, bem como, da produção de ração animal.

  Similarmente, os preços do trigo devem pressionar a alimentação e impedir que o brasileiro se consuma diariamente seu típico pão matinal e simultaneamente, repense quanto ao fogão a gás uma vez que o gás de cozinha que também já subiu 16%.

  Assim, deve-se esperar uma aceleração da inflação em meados de 2022 – de forma similar ao visto em 2021, contudo, com as chuvas e as reservas das hidrelétricas em nível estável, por enquanto, o que desacelera o impacto nos custos.

  O Maranhense será igualmente impactado por esses efeitos exógenos, muito embora as pressões possam ser superiores tendo em vista o menor nível de renda, consequentemente, maior demanda por assistência social. Mas nem todos os impactos são negativos para o Estado, uma vez que o hub de importações situado no Complexo Portuário de São Luís, possibilita crescimento da arrecadação do Estado e um menor custo operacional em relação aos demais entes da federação.

  Reitera-se, sob a perspectiva da economia, que o Brasil, do lado de fora da guerra, também possui espaço para expandir seu mercado e mudar sua posição diante das oportunidades de mercado que estão sendo abertas. Não obstante, os impactos da dependência externa brasileira estão extremamente visíveis, cabendo também, reiterar a necessidade de investimentos em substituição da matriz energética, logística e da produção externa brasileira.

Por que o dólar está subindo?

Por que o dólar está subindo?

POR QUE O DÓLAR ESTÁ SUBINDO?

*Antônio Augusto Ribeiro Brandão

No vice-versa costumeiro do mercado o dólar sobe e a Bolsa, desce; crise entre a China e os Estados Unidos reflete-se nos países emergentes, como o Brasil, de economia reflexa. A moeda americana se fortalece, porque os investidores procuram proteção.

A moeda tem três funções básicas: intermediária de trocas, medida de valor e reserva de valor. É considerada fiduciária, que diz não lastreada, mas é reconhecida e aceita pelo poder da autoridade emitente, os bancos centrais.

Vale a pena relembrar artigos escritos e publicados pelo economista André Lara Resende – ALR. falando da ‘nova’ macroeconomia, “onde a moeda fiduciária seria considerada como unidade de conta e que o governo que a emite não teria problemas em financiar-se”; assim considera irrelevante a sua função na Teoria Quantitativa (MV = PT) e expansão dos seus efeitos multiplicadores, na Base Monetária.

Em reforço à essa sua tese, ALR constata que o afrouxamento monetário ocorrido nos Estados Unidos -EUA, a partir de 2008, capitaneado pelo Federal Reserve – FED e outros bancos centrais, não causou inflação, prova de que o que esses bancos controlam mesmo é a taxa de juros, que gera expectativas.

Pessoalmente, penso que uma explicação para o fato de que a expansão da liquidez, nos EUA, não ter causado inflação estaria relacionada à diminuição da velocidade de circulação da moeda ‘V’; houve baixa demanda pelos recursos à economia real o que, segundo John Maynard Keynes (1883-1946), caracterizaria a chamada ‘armadilha de liquidez’.

Quanto ao controle dos bancos centrais sobre a taxa de juros, que é o preço do crédito e não do dinheiro; segundo ALR, no Brasil, “a taxa SELIC continua elevada ao ser confrontada com o crescimento do PIB”.

Voltando às questões cambiais, a paridade entre as diversas moedas é determinada também por esse poder da autoridade emissora – o dólar, por exemplo, é considerado a moeda-padrão e de conversibilidade mundial – e pelas relações de troca entre os diversos países, cada qual com sua capacidade produtiva ao comércio internacional, para importar e exportar.

Nos dias atuais, o dólar vem atingindo cotações elevadas em relação ao real. Há causas endógenas, que estão sob o comando das autoridades monetárias brasileiras, aliadas às exógenas, que o nosso país não comanda, como as repercussões da ‘guerra’ política entre Rússia e Ucrânia. Há quem entenda também influências psicológicas no comportamento dos investidores de mercado.

O Brasil, país considerado emergente, porém de economia reflexa, sofre os efeitos da expansão da economia americana e de sua ‘guerra’ comercial principalmente com a China; a elevação da taxa de juros por lá torna as aplicações mais atrativas e acaba determinando evasão de capitais, das bolsas brasileiras, por exemplo (agora, essa evasão exprime uma medida do risco em aplicações de longo prazo) em busca de proteção, reserva de valor. É por isso que quando o dólar sobe a bolsa cai, e vice-versa.

O Banco Central do Brasil vem atuando na tentativa de conter essa alta do dólar ofertando a moeda através das operações de “swap” (venda futura) e até utilizando partes das nossas reservas, vendendo dólar no mercado à vista, reservas essas que deveriam preferencialmente financiar as importações.

A alta do dólar deveria favorecer melhor nossos exportadores, todavia a baixa produtividade limita a competição; por outro lado, encarece as importações à reposição e expansão do nosso parque industrial, tão carente e indispensável aos investimentos indutores do crescimento econômico.

*Economista. Membro Honorário da ACL, ALL e AMCJSP.

A Eficácia das Sanções Econômicas.  

Por: José Cursino Raposo Moreira-Economista.

Iniciadas as operações militares da Rússia para a invasão do território da Ucrânia, foi instantânea a determinação, por parte dos seus apoiadores, de um conjunto de sanções voltadas a paralisarem o funcionamento da economia russa. Assim, os Estados Unidos, os membros da OTAN e seus aliados determinaram o bloqueio das reservas internacionais dos russos, no montante de 600 bilhões de dólares, criando-lhes de imediato uma crise de pagamentos externos, o que compromete sua reputação internacional e gera desvalorização de sua moeda, aumento da inflação e das taxas de juros e, no final do processo, redução do crescimento econômico do país. Também os maiores bancos russos foram banidos do mercado americano, do europeu e do principal sistema de pagamentos internacionais, o Swift, integrado por 11.000 bancos, o que dificulta a realização de negócios, elevando riscos e custos.

Como consequência de tais medidas tomadas sob o patrocínio dos estados nacionais, as próprias empresas desses países estão recuando nas suas transações comerciais com a Rússia, temendo represálias por parte de seus governos, desse modo atingindo inclusive o comércio de petróleo ou de grãos, que não são objeto do boicote, e de muitas outras atividades, num efeito encadeado de problemas para a nação asiática, no curto, médio e longo prazos.  Tais medidas, “desplugaram a Rússia por intermédio de uma bomba atômica financeira e a tornaram pária instantaneamente” segundo o Presidente do Instituto Mises, Hélio Beltrão.    Isto então significa que logo, logo a Rússia vai retroceder da invasão ao seu país vizinho, sob o temor de colapso econômico total? Não, necessariamente, devendo a resposta a tal questionamento observar as especificidades do caso e do momento.

Diferentemente de Cuba, Venezuela, Coréia do Norte e Iran, que vivem há longo tempo sob sanções econômicas, a Rússia é uma potência nuclear, além de econômica e política, e nessa condição tanto pode resistir bem a tais medidas, como também invertê-las, em razão de certas circunstâncias geopolíticas. Por exemplo, Rússia e Ucrânia vendem 30 % do trigo e 20% do milho no mercado mundial. A Rússia é o maior exportador de fertilizantes e tem quase 8% do mercado exportador de petróleo. A asfixia financeira da Rússia pode dar em calote da sua dívida externa, situação por si só suficiente para causar problemas na economia mundial. Ou seja: conforme o economista Vinicius Torres Freire “os tiros da guerra contras Putin são em parte um bumerangue contra o Ocidente”.

O que parece, é que a maior ou menor eficácia das medidas do boicote econômico promovido para dissuadir a Rússia de anexar a Ucrânia aos seus domínios vai depender da duração do conflito militar entre os dois países. Quanto mais se prolongarem os combates, a tendência é de as sanções aumentarem seus efeitos danosos para a Rússia, pois a crise de liquidez de sua economia pode levar ao esgotamento das suas reservas que escaparam ao “sequestro” dos ocidentais. Daí a pressa de Putin em se fortalecer com uma vitória militar para negociar em melhores condições tanto as compensações a Ucrânia, do ponto de vista de sua reconstrução, quanto a suspensão das medidas contra sua economia, promovidas pelos Estados Unidos e seus aliados.

Mas vale ressaltar que este caso evidencia a influência e as potencialidades da contemporânea configuração da Economia Globalizada, significando que doravante as guerras entre os países podem se travar sem sequer um disparo de armas de fogo ou do uso da aviação ou marinha, tudo substituído pelo emprego dos contemporâneos mecanismos da economia digital dos nossos dias. Enquanto isso não acontece, as consequências de mais uma guerra no mundo vão adiando para mais distante a superação dos efeitos da Covid 19 sobre todos os países.

Crônica: Leveza e Memória

LEVEZA E MEMÓRIA

Antônio Augusto Ribeiro Brandão

De uns tempos para cá resolvi ficar mais leve, uma das coisas que Jorge Luís Borges (1899-1986) manifestou vontade de fazer na vida, se pudesse voltar a ser jovem. Mas enquanto houver vida, vale a pena tentar.

Ao desbastar meus “Arquivos Implacáveis” – como João Condé (1912-1996), da revista “O Cruzeiro”, intitulava suas crônicas -, que esforço ler, rasgar e queimar: folhas de jornais, escritos diversos, documentos de tempos idos, quase tudo virou papel picado ou cinza de papel, ou simplesmente foi mandado para o lixo. Mas muito ainda voltou a ser guardado. Não é sempre assim?

Fiz questão de preservar, entretanto, alguns papéis, a fim de ficar em paz com a minha consciência: registros do futebol – durante longo tempo foi meu esporte favorito – e dos seus melhores jogadores; reportagens do maravilhoso e já centenário mundo do Jazz; história da vida genial de Charlie Chaplin (1889-1977), essa figura familiar e desajeitada que vimos em Luzes da Ribalta, O Grande Ditador, Tempos Modernos, Um Rei em Nova York, em geral criticando, à sua maneira jocosa, a situação dos menos afortunados da sorte, em bairros miseráveis; lamentos sobre o fechamento do Maxwell’s, um dos mais tradicionais restaurantes de Nova York, onde estive quando visitei a cidade pela primeira vez; pesares sobre a morte do cantor Pedro Vargas (1906-1989), que embalou momentos da minha mocidade cantando boleros e “encontrei”, em Madri, num busto em sua homenagem, nos jardins de uma famosa casa de shows de música e dança flamenca (ou flamenga), manifestação “cujas origens remontam às culturas cigana e mourisca”.

Referências à época de Irving Berlin (1888-1989), imigrante russo que produziu letra e música para mais de mil canções, 18 shows musicais e trilha sonora de 17 filmes, e foi o último elo de ligação da música americana com a chamada Era de Ouro da sua canção popular. Berlin teve importantes compositores contemporâneos: Jerome Kern (1885-1945), o pai, o professor, o mestre e o rei dos compositores do teatro americano; George Gershwin (1898-1937), considerado o maior gênio musical nascido nos Estados Unidos da América; Cole Porter (1891-1964), que vivia luxuosamente, na cidade, no campo, na Europa e, finalmente, na torre do Waldorf Astória, em Nova York, figurando entre os grandes mestres da música popular norte-americana, com partituras produzidas e somente identificáveis com ele; Richard Rodgers (1902-1979), em parcerias com Oscar Hammerstein II (1895-1960) e Lorenz Hart (1895-1943), fazendo o teatro musical desenvolver-se e atingir a maturidade, com Oklahoma (1943) e Carousel (1945), na Broadway.

Torcedor do Fluminense, foi campeão carioca, em 1946, super. O goleiro Oswaldo Alfredo da Silva (1923-1999), o Oswaldo ‘baliza’, do Botafogo, a propósito do jogo, disse “não ter tido chance de defesa na jogada” de Ademir Marques de Menezes (1922-1996), o Ademir ‘queixada’, do Fluminense, autor do único gol da partida.  Uma curiosidade: com o ‘bicho’ recebido pela vitória, Ademir trocou o seu Lincoln por um Chevrolet hidramático do ano.

Tempos depois, no Rio de Janeiro, em 1955, Oswaldo não jogava mais, apenas ‘peladas’ no interior do Estado (tive oportunidade de assistir a um desses ‘jogos’), porém ainda vi Ademir, em fim de carreira, jogando pelo Vasco. Ele era do tipo rompedor: com a bola próxima dos pés, muita velocidade na corrida, ninguém o alcançava até marcar o gol, às vezes “com bola e tudo” depois de driblar o goleiro. Merecem ser lembrados, Ademir e Oswaldo. Gostei muito de futebol e até treino assistia; estive presente em quase todos os gramados do Rio. Vi jogar os maiores craques do mundo, em clubes e seleções, mas Ademir era único em seu estilo.

E a história do Jazz? Nomes como Duke Ellington (1899-1974), Dizzy Gillespie (1917-1993), Ella Fitzgerald (1917-1996), Sarah Vaughan (1924-1990), Count Basie (1904-1984), Charlie Parker (1920-1955) e Louis Armstrong (1901-1971), em mais de um século construíram a encantadora história desse ritmo de estilos variados, cuja improvisação é uma das suas características principais. Valeu a pena guardar tudo de novo.

Tudo está registrado no Jornal do Brasil (13/04/1989, 01/06/1989, 27/09/1989, 31/10/1989, 23/05/1990 e 30/08/1992), e no Estado do Maranhão (11/11/1984, 15 a 21/02/1987 e 31/03/1991), todos bem desbotados, para quem quiser conferir e obter maiores detalhes, porque a cultura não é propriedade de ninguém, todavia um processo de acumulação e conquista da humanidade.

Entretanto, desejando ficar ainda mais leve o em paz com a minha consciência, resolvi desfazer-me de praticamente tudo que havia ‘sobrado’, abdicar de coisas terrenas, memórias, honrarias, coerente com o processo de acumulação cultural acima referido.

Assim é que: migrei à categoria de Honorário das três Academias de Letras às quais pertenço; deixei de ser filiado a Centros de excelência, contribuir com Universidades, de integrar Associações internacionais e Movimentos literários nacionais de escritores. Fiz várias doações dessa minha memória, principalmente de meus Livros e textos jornalísticos, artigos e crônicas, para as Academias, Bibliotecas, professores, ex-alunos e amigos de trabalho; não publicarei mais meus textos em Jornais nem Revistas, dos quais não tenho mais assinatura; deixei de frequentar as mídias sociais. São, vamos dizer assim, meus ‘outros amores perdidos’.

E de onde veio a inspiração para esta crônica? Sobre leveza, de Jorge Luís Borges, que somente se deu conta desse prazer já no fim da vida; sobre os grandes da música, do teatro e do cinema americanos, creiam, dos alto falantes de Caxias e do Cine Rex, também da minha cidade, que abrigou todos os grandes filmes musicais da época.

Por fim, uma explicação para os meus leitores. Querem saber a razão das minhas preferências por citações e fixação de datas? As citações, embora nem sempre guardem afinidades com os assuntos das crônicas ou dos artigos que escrevo, procuram valorizar seus autores e as circunstâncias inspiradoras em que viveram; as datas marcam o começo e do fim da vida de cada um e podem valorizar tudo o que fizeram, no pouco ou muito tempo de sua permanência entre nós.

*Economista. Membro Honorário da ACL, ALL e AMCJSP.

Quais os rumos da recuperação econômica?

Por:
Marcello Apolônio Duailibe Barros
– Economista (UFMA), Mestre em Administração Pública (FGV) e Vice-Presidente do CORECON-MA.

João Carlos Souza Marques – Economista, Mestre em Desenvolvimento Socioeconômico (UFMA) e Presidente do CORECON-MA.

Wilson França Ribeiro Filho – Economista, Mestre em Desenvolvimento Socioeconômico (UFMA) e Conselheiro do CORECON-MA.

Em um breve prelúdio, deve-se relembrar que a recuperação econômica que o país precisa experimentar não está associada exclusivamente aos impactos que a COVID-19 nos deixou. Para além de um “novo normal”, precisa-se recordar que diferentemente de inúmeros países o qual a pandemia foi a única causa para a desestabilização da economia, o Brasil já passava por uma pré-existente crise que se arrastava desde 2015. O desemprego e a inflação já eram sócios em uma empreitada que culminava com o esfacelamento dos avanços do período 1990-2010, cabendo à Sars-CoV-2 ampliar a crise estrutural brasileira e a má gestão macroeconômica, política, diplomática e sanitária do Governo Federal o papel de Nero tupiniquim. Com isso, não pode se creditar apenas as consequências das medidas sanitárias como causas da crise econômica no ano de 2020 (até hoje).

Uma vez contextualizado, avancemos para os dados divulgados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNADc) do IBGE sobre o 4° trimestre de 2021, que permite avaliar preliminarmente a recuperação econômica que se ventila. O Maranhão encerrou o ano com uma taxa de desocupação/desemprego de 13,10%, 1,35 p.p menor que o mesmo período de 2020 e 3,89 p.p menor em relação ao 1° trimestre de 2021.

Esta melhora no nível de emprego pode ser considerada como fruto da flexibilização das medidas restritivas, que permitiu às empresas funcionarem por mais tempo e abrindo mais vagas de trabalho. Uma prova disso é a redução da informalidade no Estado. A taxa de informalidade, que inclui todos os trabalhadores sem carteira assinada, trabalhadores por conta própria e trabalhadores familiares auxiliares (que ajudam apenas em casa e/ou em pequenos negócios domésticos sem remuneração), caiu de 67,51% no 4° trimestre de 2020 para 66,87% no 4° trimestre de 2021; uma boa notícia! Soma-se a isso as estimativas de maior crescimento do PIB estadual para 2021, esperada para 4,1%.

Entretanto, os dados demonstram que a conjuntura não é bem por aí. O rendimento médio efetivo do maranhense caiu ao longo de 2021, passando de R$ 1.512,90 no 1° trimestre para R$ 1.469,00 no 4° trimestre, ainda que este nível seja maior que o 4° trimestre de 2020, cujo rendimento médio era de R$ 1.360,90, lembrando dos auxílios emergenciais que foram muito importantes para manutenção da renda. Esta queda de 2,90% demonstra que os empregos gerados ao longo de 2021 não remuneram tão bem quanto no seu início, o que torna uma recuperação “manca”.

Mas por que “manca”? A geração de empregos é sempre positiva para a economia, mas quando se coloca em um patamar abaixo em termos de renda, podem existir situações de subconsumo que, aliado com a pressão inflacionária, já acima dos dois dígitos, não conseguem alavancar a economia local. Com isso, se cria uma armadilha perigosa para o processo de recuperação econômica, no qual temos mais pessoas empregadas, mas ganhando menos e com uma situação periclitante para manter seu padrão de consumo ou até mesmo a subsistência. Apesar disto, a desigualdade de renda, mensurado pelo Índice de Gini, caiu aproximadamente 5,17% ao longo de 2021 no Maranhão, chegando a 0,51 no 4° trimestre de 2021, o que também pode ser um sinal pessimista quando a renda média está caindo. Neste ponto, chegamos à encruzilhada que se verbalizou no título. É preciso construir um caminho para a recuperação econômica e definir um destino a ele.

No que a conjuntura estadual apresenta, a desigualdade cai, os empregos crescem, estimativas para o PIB continuam positivas, mas sem tornar a população do Estado “mais rica”, sem dotar maior poder de compra ao maranhense que vê seu salário não chegando ao final do mês. Para onde este caminho nos leva? As incertezas que o ano de 2022 prega neste contexto político-eleitoral coloca a economia a níveis elevados de tensão, como se fosse uma corda de violino, na ausência de um ritmo compassado, com notas claramente desafinadas, e tocadas em ritmos lentos, mas tão lentos a ponto de pensar que a música parou. Só que estamos tocando.

A política econômica ficou a mercê das oscilações conjunturais e internacionais, sem estratégia. Não há um receituário claro, ao ponto de se expressar ritos de uma política de crescimento econômico nacional e estadual ideais para alavancar o desenvolvimento.  A avaliação hoje é que não são necessários esforços mais profundos para o crescimento econômico, pois de maneira natural a economia irá caminhar para algum lugar. Mas para onde e a que velocidade?

 

A EDUCAÇÃO E O BRASIL

 A EDUCAÇÃO E O BRASIL

*Antônio Augusto Ribeiro Brandão

  Recentes estatísticas demonstram a realidade das sequelas da pandemia no desempenho de nossas crianças, entre 7 e 9 anos:  a carência na leitura e escrita aumentou em mais de duzentos por cento. Some-se a isto o incentivo das redes sociais ao ‘institucionalizar’ a linguagem dos sinais, das caretas e equivalentes, inibindo o ato de escrever.

 Outro dia estive lendo que há uma versão bem pragmática sobre os descaminhos da atual geração de estudantes: ainda estão sendo ensinados por professores partícipes dos movimentos de contestação dos valores e crenças tradicionais, adeptos da liberação dos usos e costumes. Com as exceções de praxe, será possível um Brasil bem educado?

 E mais, por exemplo, situação que persiste em cada município do interior do Brasil: quando o filho que ajuda o pai na agricultura familiar chega à idade de estudar na cidade, o pai reage e apega-se aos políticos influentes, para conseguir instalar uma escola na sua localidade. Daí decorrem instalações deficientes e em locais inapropriados, dificultando o acesso dos próprios alunos e professores.

 Reflitamos sobre alguns dados divulgados no Fórum acima referido: “se não houvesse reprovação de crianças, o Brasil poderia poupar cerca de bilhões de reais por ano; se reduzíssemos o desperdício nas despesas atuais com educação, poderíamos aumentar o salário de todos os professores do ensino básico; se fosse possível evitar faltas anuais de cada professor do ensino básico, seria possível a contratação de muitos novos professores e um acréscimo nos seus salários; grande parte da população não completa o equivalente ginasial, básico; a maioria dos alunos não dominam habilidades elementares de matemática; muitos alunos não sabem ler adequadamente, porque quem não sabe ler também não sabe escrever.”

 Essa realidade revela que os professores precisam repensar sua atitude em face da profissão que abraçaram, das menos egoístas que conheço. Salário é importante, mas precisam também usar suas cabeças e seus corações, de resultados que justifiquem os grandes investimentos que estão sendo feitos na educação; precisam de mais qualidade e de produtividade naquilo que fazem, e se conseguissem diminuir a evasão e a repetência nas suas classes, o desperdício, certamente poderiam obter melhorias financeiras. A realidade enfraquece suas reivindicações.

 É imperioso, portanto, que os professores pensem na nobre profissão que exercem, longe de radicalismos e de lideranças ultrapassadas, evitando apoiar movimentos de evidentes conotações políticas.

 Tentar cooptar crianças e adolescentes e seus respectivos familiares é uma ‘contribuição’ desagregadora, indisciplinada; sou do tempo em que o(a) professor(a), além de ensinar, também educava. Os mestres daquela época eram tão responsáveis que chegavam a substituir os próprios pais: premiavam e castigavam, incutir responsabilidades com a sociedade e com a Pátria. Ninguém chegava à 1ª série do curso primário (hoje, do ensino fundamental) sem saber ler e escrever.

 Insisto na tese: o que deveria vir primeiro para um professor: um aumento de salário ou um trabalho produtivo que o fizesse merecedor desse aumento?

   

Economista. Membro Honorário da ACL, da ALL e da AMCJSP.

 

Custo do Capital

CUSTO DO CAPITAL

Por: Antônio Augusto Ribeiro Brandão¹

 “Quando acertamos, ninguém se lembra; quando erramos, ninguém se esquece.” Ditado Irlandês.

 

 

 

 

Em tempos de crise, como agora, as Bolsas de Valores do mundo todo são as que primeiro refletem as dificuldades dos agentes de produção, com abruptas alterações no valor de mercado das empresas refletidas nas cotações das ações negociadas e determinantes, em alguns casos, de graves prejuízos. Há um sobe-desce acompanhando inversamente a variação do dólar.

Há que considerar, também, nesses tempos, a taxa de juros elevada entendida até como instrumento de política monetária, de combate à inflação; agora, elas estão mais ou menos comportadas e, alguns casos, proporcionando rendimentos negativos. Há, portanto, um custo de oportunidade envolvido na tomada de decisão.

Investir implica na necessidade de financiar e a estrutura de capital das empresas – e dos governos – resulta das suas diretrizes de financiamento: usar recursos próprios ou de terceiros, entretanto, deve envolver o conhecimento prévio dos custos desses recursos. Quanto custa o capital?

A decisão de investir decorre do exame de alternativas e da escolha daquela que melhor remunera o capital; o custo do capital é um padrão financeiro máximo para as despesas de capital.

Poderíamos imaginar o custo do capital igual à taxa de juros, para facilidade de entendimento e simplificação da realidade; bastaria que o empresário fosse eficiente na aplicação dos recursos para ter garantido um retorno compensador, como se tudo dependesse de variáveis internas e estivéssemos em um mundo de certeza absoluta. Tal não ocorre, todavia, na prática. Por quê?

Primeiro, porque a taxa de juros não é um padrão financeiro comum para recursos próprios e de terceiros; o empresário paga os juros do capital de terceiros independente da lucratividade do seu negócio enquanto a sua própria remuneração e a de seus acionistas fica na dependência dessa lucratividade. Depois, como variáveis externas, fatores conjunturais interferem no processo tornando complexa a tarefa de determinar o verdadeiro custo do capital, que varia de empresa para empresa e de lugar para lugar, em virtude da diversidade de padrões de eficiência e dos custos cobrados pelas diversas fontes de financiamento.

Apesar das limitações, a empresa necessita ter um padrão financeiro que determine sua taxa mínima de retorno e o limite máximo das suas despesas de capital; existem várias fórmulas de calcular essas variáveis, mas, tudo depende da eficiência na gestão dos recursos e do posicionamento no mercado de capitais.

Um pouco de aspectos práticos à tomada de decisão na atual conjuntura, no curto prazo: as estatísticas registraram mais um trimestre de queda do PIB brasileiro, com altas e baixas nas vendas de setores diversos da economia; por outro lado, recursos globais para investimentos mostram-se disponíveis às aplicações no mercado de ações de países emergentes, como o Brasil, considerados os riscos envolvidos, como alternativa à baixa rentabilidade nos países desenvolvidos.

A crise que assola o Brasil tem um forte componente político, que precisa ser equacionado; a manutenção dessa liquidez internacional, com possibilidade de refletir-se ainda mais no nosso mercado de capitais, é função da confiança que os investidores estrangeiros – também os nacionais – possam ter na recuperação da nossa economia.

¹Economista. Membro Honorário da ACL, da ALL e da AMCJSP.